Ansiedade e depressão estão entre os principais males que atingem os jovens, apontam especialistas

 


                                                    Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

morte do influenciador e humorista Rodrigo Amendoim, na noite do último sábado (28), voltou a colocar em foco o tema da saúde mental. Isso porque, após o episódio, diversos relatos envolvendo o estado emocional do influenciador ganharam as redes. O Portal M! ouviu especialistas sobre o tema, que elencaram a

ansiedade e a depressão como os principais males que afligem os jovens. 

O psicólogo Sergio Manzione lembrou que a incidência da ansiedade é extremamente alta no Brasil, com o país ocupando a liderança no número de casos diagnosticados - em relação à depressão, estamos na quinta colocação.

Na avaliação do especialista, um dos principais fatores que explicam esse cenário é a busca pela aceitação dos outros e a necessidade de atender às expectativas, além do medo do "cancelamento", que se reflete no receio da rejeição, do abandono, e que está presente em todos os seres humanos. 

Psicólogo Sergio Manzione | Foto: Divulgação

"Essas questões podem pressionar a pessoa para um momento em que ela não se sente adequada, em que ela não se sente pertencente a nenhum grupo, que ela não atende às expectativas das pessoas. Isso pode ser dentro de uma família também, não necessariamente só em redes sociais, mas a rede sempre vai potencializar isso. É bom lembrar que redes sociais são apenas uma mídia.  Os problemas não estão na internet em si, os problemas estão com as pessoas que fazem uso dela. Então, essa pressão das redes sociais pode vir também na questão dos corpos perfeitos", afirmou.

Já o psiquiatra assistente da Clínica Holiste, Leonardo Araújo, pontuou que a questão envolvendo as mídias sociais e a "multiplicidade de filtros", necessários para que alguém se sinta confortável, podem gerar muita ansiedade para que as pessoas mostrem um "mundo perfeito" durante todo o tempo.

"Isso gera muita ansiedade para mostrar um mundo perfeito, idealizado, onde não há margem para nenhum erro. Agora, com a cultura do 'cancelamento', as pessoas sempre estão muito auto-vigilantes e se sentindo muito julgadas, sobretudo nessa idade onde se espera uma força de trabalho, sucesso na carreira e muitas vezes isso não acontece, por várias questões da vida. Muitas vezes, quando se depara com o universo dos outros dentro dessas mídias sociais, isso acaba reverberando em rebaixamento de humor, tristeza, frustração e, inevitavelmente, em alguns casos, suicídio", avaliou.

De acordo com dados da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab), até 30 de agosto deste ano, 459 pessoas cometeram suicídio na Bahia. Já em 2022, durante todo o ano, foram 849 e em 2021, 842. 

Em nível nacional, os voluntários do Centro de Valorização da Vida (CVV), atenderam cerca de 650 mil ligações no segundo trimestre deste ano. O número é próximo ao registrado no mesmo período do ano passado, que somou 690 mil.

No segundo trimestre, maio foi o mês com maior volume de ligações atendidas, com 227.614. Já no primeiro trimestre do ano, pouco mais de 700 mil ligações foram atendidas pelos voluntários.

Principais sinais 

Araújo também ressaltou que a tristeza e o rebaixamento de humor são alguns dos sinais que as pessoas podem dar ao estarem enfrentando problemas de saúde mental. Além disso, a anedonia -  a perda da capacidade de sentir prazer nas atividades do dia a dia - também é  um sinal preocupante. 

Anedonia é sinal de alerta, segundo o psiquiatra Leonardo Araújo | Foto: Divulgação

"Às vezes, a pessoa tem menos energia, alteração no apetite para mais ou menos, alteração no sono. Muitas vezes, essa sinalização de um suicídio vem de maneira verbal. O paciente traz isso, que tem pensado mais em morte, pensado em sumir. Traz o sentimento de desesperança no discurso, na narrativa dele. Então, são as coisas que acendem um sinal vermelho para a gente estar mais atento e vigilante para intervir, evitando assim o fim trágico por meio do suicídio, uma vez que cerca de 95% dos casos tem um transtorno mental associado que pode ser tratado", alertou. 

Diante disso, o especialista defende a necessidade de as pessoas em volta estarem atentas a qualquer modificação em padrões de comportamento.

"Uma pessoa que sempre foi extrovertida, engraçada, sociável e, de repente, passa a ficar mais retraída, cancelando compromissos, evitando estar próxima de pessoas que ela sempre gostava. Muitas vezes, isso é trazido para o corpo de maneira somática, com ataques de pânico, taquicardia, que levam [a pessoa] ao serviço de emergência achando que está tendo um infarto, um AVC", listou. 

Manzione também chama atenção para a importância de observar as mudanças de comportamento. Na avaliação do especialista, se uma pessoa tem uma maneira de ser e, de repente, isso é mudado de forma brusca, é necessário ter atenção. Além disso, ele alerta para o isolamento social. 

"Hoje é muito comum isso. Como existe uma dependência grande das redes, as pessoas ficam presas em cima de um celular, de um computador. Não precisa estar em um ambiente fechado, no quarto. A pessoa se isola mesmo em público, porque ela está usando aquele celular. Isso faz com que as pessoas percam um pouco as habilidades sociais, de lidar com as pessoas. E com isso deixa de aprender a lidar com os sofrimentos, com as frustrações. Isso vem muito desse contato social". 

O profissional também lembrou da característica cruel das redes sociais, que é refletido em diversos casos de discurso de ódio contra pessoas, e que, segundo Manzione, pode ocasionar um quadro de suicídio. Já com relação aos sinais, Manziona pontuou que eles têm a ver com pensamentos. 

"Pensamentos que podem ser remoídos obsessivamente, a pessoa fala sem esperança, não tem foco em nada e fala de uma maneira muito arrastada em termos da própria esperança e vê que a vida já não tem muita muita coisa, com comentários sempre depreciativos. Um segundo sinal seria em relação ao humor, alterações que são extremas no humor, podem sinalizar emoções suicidas, excesso de raiva, sentimento de vingança, ansiedade, irritabilidade, sentimentos intensos de culpa ou de vergonha também são sinais que a pessoa tem que ficar atenta". 

Ele lembrou ainda  que a atenção deve se estender às pessoas que já possuem algum tipo de transtorno psicológico. "A bipolaridade, a depressão e a esquizofrenia são três condições mentais  que são as maiores causadoras de suicídio. Outros sinais são os avisos, frases como 'a vida não vale a pena', 'estou tão sozinho que queria morrer', 'você vai sentir a minha falta?', 'então eu vou deixar vocês em paz', 'eu não vou atrapalhar mais ninguém'. Quando a pessoa se sente um fardo, tem que buscar ajuda", ressaltou. 

Outra coisa que pode passar despercebida, de acordo com o psicólogo, é aquela "melhora súbita", que pode ser percebida entre as pessoas que já estão apresentando um quadro de sofrimento por um perído e depois exibem uma melhora repentina.

"Tem que buscar ajuda, porque às vezes essa melhora repentina é um sinal de que ela já concluiu que o suicídio é a saída, então ela relaxa porque ela já achou uma saída. Lembrando também que a pessoa não se suicida para se matar, a pessoa se suicida para se livrar de um problema, de um sofrimento", observou.

Outro sinal é o desapego. Segundo Manzione, quando a pessoa começa a vender coisas ou dar as coisas que gosta, pode ser um indicativo de problema. Da mesma forma, ele pontuou que a "irresponsabilidade" pode ser mais um sinal para esse quadro preocupante.

"Comportamento irresponsável, perigoso, sem medir consequência, uso excessivo de álcool, drogas, direção imprudente, a pessoa começa a dirigir que nem um doido, sexo sem proteção, aí já são indícios que a pessoa já não está dando importância à própria vida, isso também é um sinal de alerta. Como eu falei antes, mudança de rotina, mudança de comportamento, todo mundo tem um lugar que gosta de frequentar em especial, então precisa ver se não tem mudanças de rotina, deixa de ir para os lugares, não atende mais telefone, não gosta mais de falar com as pessoas, abandona atividades que dava prazer. Então, o apoio de alguém aí é muito importante porque precisa ter essa ajuda rápida".

Escuta compreensiva e paciente

Por fim, os especialistas também falaram sobre como proceder ao perceber determinados sinais de alerta em familiares ou amigos. Para Manzione e Araújo, um dos principais fatores é contar com o apoio de uma pessoa próxima. 

"Ao identificar os sinais é preciso apoio, conversar, escutar com paciência, sem julgamento, sem expor nenhum sentimento que faça a pessoa se sentir culpada e envergonhada. Não é para criticar, não é para julgar, tem que ser direto, perguntar se a pessoa está com pensamentos suicidas. E por meio da resposta você já pode obter um indício. A melhor saída é sempre o diálogo. Então é importante e é preciso se colocar à disposição da pessoa e ouvi-la sem julgamentos, nem opiniões", orienta Manzione. 

Ele alerta também que falas como "isso é falta de Deus" e "isso por que você está passando não é nada" só pioram o quadro dessas pessoas.

"Se a pessoa tiver uma depressão, é uma doença mesmo. A gente tem que lembrar que existe um suicídio a cada 45 minutos no Brasil, cerca de 14 mil mortes anuais. Para cada morte, tem outras 20 tentativas, então para cada um que morre houve outros 20 que tentaram. No mundo, tem cerca de 800 mil mortes anuais, um suicídio a cada 30 segundos. Então, coloque-se à disposição para ouvir sem criticar", recomendou. 

Da mesma forma, o psiquiatra Leonardo Araújo orienta as pessoas em volta a permanecer  atentas e oferecer conforto. Segundo ele, "uma palavra e um ouvido"  são muito importantes e podem ajudar no encaminhamento dessas pessoas para especialistas na área. 

"Pessoas que podem oferecer tratamento visando a minimização dessa tristeza, dessa aflição. A rede de apoio deve sempre funcionar como escuta e direcionamento para os profissionais de saúde mental que possam lidar de maneira objetiva com isso e diminuir, mitigar esse sofrimento. A rede de profissionais pode acolher esse sofrimento, medicá-lo, indicar uma terapia, e assim a gente evitar um fim trágico". 

Se precisar de ajuda, procure o CVV

Para as pessoas que querem e precisam conversar, existe o Centro de Valorização da Vida (CVV),  serviço voluntário gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio, sob total sigilo e anonimato.

O CVV oferece atendimento pelo telefone 188 (24 horas e sem custo de ligação), por chat, e-mail e pessoalmente. Nestes canais, são feitos mais de 3 milhões de atendimentos anuais, por aproximadamente 3.500 voluntários, presentes em 20 estados, além do Distrito Federal.

Fonte: Muita Informação

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