Baixa audiência dos desfiles na TV compromete o futuro das escolas de samba

 

 
A escola Paraíso do Tuiuti em desfile na Sapucaí: transmissão pela TV teve baixa audiência 


Ao longo das décadas de 1970 e 1980, a imprensa lamentou o fim do Carnaval de rua. A maior parte da folia se concentrava nos desfiles das escolas de samba e nos

bailes fechados. No Rio de Janeiro, o Cordão da Bola Preta e a Banda de Ipanema sempre arrastaram multidões, mas muitos bairros ficavam praticamente desertos. São Paulo, então, fazia jus ao terrível apelido dado por Vinícius de Moraes, o de “túmulo do samba”.

O panorama começou a mudar a partir dos anos 1990. Blocos recém-fundados, como os cariocas Simpatia é Quase Amor ou Suvaco do Cristo, cresceram e se multiplicaram. O Carnaval da Bahia, que nunca foi desanimado, explodiu junto com o axé e outros ritmos locais. Até os paulistanos entraram na dança, com a criação de agremiações como o Acadêmicos do Baixo Augusta.

Uma nova geração de foliões tomou o Brasil de assalto. A primeira vítima foram os bailes. Festas tradicionais, onde outrora se disputavam badalados concursos de fantasia, simplesmente deixaram de existir. Quem estaria disposto a pagar uma pequena fortuna pelo ingresso, se saía até mais barato ter o celular roubado numa muvuca ao ar livre?

Mas as escolas de samba resistiram com galhardia. O afrouxamento das regras, que antes proibiam patrocínios externos e exigiam enredos 100% brasileiros, permitiu bizarrices como desfiles bancados por marcas de shampoo ou iogurte, e até mesmo pelo governo ditatorial da Guiné Equatorial.

Só que a bonança financeira dos primeiros 15 anos deste século evaporou, e com ela a disposição das grandes marcas em investir na Sapucaí. Mas uma outra coisa contribuiu ainda mais para que as escolas de samba deixassem de ser vistas como oportunidades de marketing: a audiência decrescente dos desfiles na TV, um fenômeno que foi exacerbado pela pandemia.

Como apontou minha colega Cristina Padiglione, este ano os números da transmissão pela Globo até superaram a média habitual do horário, mas foram menores que os do ano passado, quando os desfiles aconteceram em abril. O jornalista Ricardo Feltrin, do UOL, revelou que este foi o segundo Carnaval de menor Ibope da história, perdendo só para o de 2013. E Guilherme Ravache, também do UOL, contou que a Globo só conseguiu vender uma das cinco cotas de patrocínio que ofereceu ao mercado publicitário. Ou seja: tomou prejuízo.

Tudo isto significa que vem mudança por aí. Não acredito que a maior emissora do país simplesmente deixe de exibir ao vivo os grandes desfiles do Rio e de São Paulo, mas talvez mude a forma de transmissão. Talvez até corte investimentos, deslocando menos profissionais para o sambódromo.

Uma receita menor em propaganda também significa um provável repasse menor às escolas de samba. Elas já não contam mais com as verbas das grandes corporações, que preferem anunciar em outras mídias. Se perderem parte da grana que recebem da TV, terão que diminuir o orçamento do que já foi chamado de “maior espetáculo da terra”.

E aí entramos num ciclo vicioso: menos dinheiro, desfiles mais pobrinhos, ainda menos audiência na TV, ainda menos dinheiro. As escolas de samba podem ter um desafio e tanto pela frente.

Muita coisa que fez sucesso no Carnaval já não existe mais: o desfile de fantasias do hotel Glória, o baile Vermelho e Preto, o banho de mar à fantasia, o corso na Avenida Atlântica, em Copacabana… Faz parte da dinâmica da festa. Mas será que estamos prontos para um Carnaval sem escolas de samba do tamanho que elas têm hoje?

Tony Goes, Folhapress


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